“O Juramento de Hipócrates continua a representar hoje um marco ético importante”

“O Juramento de Hipócrates continua a representar hoje um marco ético importante”

Um dia para recordar, sempre. “Um marco ético”, sublinhou Manuel Teixeira Veríssimo, o anfitrião.  A cidade da Covilhã acolheu a última cerimónia solene de Juramento de Hipócrates deste ano

“O dia de hoje reveste-se de um forte simbolismo, pois marcará o início da vossa atividade como médicos ao receberem a vossa cédula profissional. A Secção Regional do Centro da Ordem dos Médicos sente uma alegria imensa por vos acolher e por poder contar convosco.”. Estava dado o mote, nas palavras da apresentadora da cerimónia a médica de família Teresa Pascoal para a cerimónia de Juramento de Hipócrates, na Covilhã, que decorreu no Teatro Municipal.

A apenas três semanas de terminar o internato de especialidade de Psiquiatria, a médica Carolina Cabaços, vocalista da banda Sexta Feira Santa não podia estar mais orgulhosa do seu percurso, ela que nasceu precisamente naquela cidade beirã. “Também eu fiz em 2017 o meu Juramento de Hipócrates, em Coimbra (…) . Pode ser difícil nesta fase em que vocês se encontram perceber a verdadeira importância destas palavras na vossa vida. Mais do que estetoscópio e bata branca, vocês vão carregar o peso mas também a honra contida nessas mesmas palavras”. Destacando um conjunto de valores inerentes à profissão médica, Carolina Cabaços citou entre eles, o princípio de ‘não causar dano ao outro’ como o “mais fundamental de todos”.

Para o Presidente da Sub-região de Castelo Branco da Ordem dos Médicos, Miguel Castelo-Branco, e no intuito de melhor trilhar o caminho profissional, a seu ver, é necessário um “exercício bastante rigoroso de auto-avaliação”. Dirigindo-se aos jovens médicos – a maioria dos quais naquela manhã receberam os diplomas de curso – lembrou que “a partir de agora terão de tomar decisões” e, também, ter “como opção séria a escolha pelo Serviço Nacional de Saúde (SNS) como local de trabalho”. Aliás, Miguel Castelo-Branco assegura mesmo que “é bom trabalhar no SNS”, “um serviço de elevada qualidade” comparando-o até com outros países. “Enquanto médico, responsáveis pela Saúde, é muito importante que continuemos a contribuir para a capacitação de um sistema cuja finalidade é assegurar que cada cidadão em Portugal tem acesso a cuidados de saúde de alta qualidade independentemente do sítio onde está  e das condições financeiras que tem”, afirmou o também Presidente da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade da Beira Interior.

Por seu turno, o presidente da Secção Regional do Centro da Ordem dos Médicos, Manuel Teixeira Veríssimo, dirigindo-se diretamente aos jurandos, disse: “Hoje é um dia importante e marcante para as vossas vidas, pois, ao assumirem o Juramento de Hipócrates comprometem-se com uma missão grandiosa e eticamente vitalícia. O Juramento de Hipócrates, embora seja uma prática antiga, ainda continua a representar hoje um marco ético importante”. Sustentando que a “Medicina é uma ciência mas também é uma arte”, o presidente da SRCOM sublinhou ainda que “mais do que palavras, este juramento é um contrato moral com promessa inabalável de dedicação aos doentes”.

Acrescentou ainda: “Como médicos deveremos ser também educadores, confidentes, orientadores e, por vezes, a âncora da esperança para quem sofre. Deveremos cultivar o conhecimento e o aprimoramento técnico e ético, nunca perdendo de vista que, por mais que saibamos, seremos sempre uns eternos aprendizes na vastidão do desconhecido que é o Ser humano”. Desejou, por fim na sua intervenção: “Que a vossa vida profissional seja iluminada pela sabedoria, pela compaixão e pelo desejo incessante de aliviar o sofrimento humano.”.

Coube a Massano Cardoso proferir a Oração de Sapiência. Para o Professor Catedrático Aposentado da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra – e que foi também membro da comissão instaladora do curso de Medicina e professor catedrático convidado na Universidade da Beira Interior – é de enaltecer a dedicação dos pais neste trajeto singular dos seus filhos.

Ao recordar o tempo em que “os clínicos dispunham de um limitadíssimo arsenal terapêutico”, lembrou que, em contrapartida, “sabiam ouvir, consolar e acompanhar os seus doentes”, postura de compreensão e atenção ao outro que os elevou a “semi-deuses”. 

Massano Cardoso lembrou o mito de Titono, mortal por quem a deusa Aurora se perdeu de amores e a quem Zeus concedeu a pedido desta a imortalidade, mas sem conceder o dom da juventude. Titono envelheceu e ficou demente. Aurora com pena do amado, transformou-o então numa cigarra, símbolo de imortalidade. E, com essa menção, o orador abordou como hoje os médicos vão mais longe, em tratamentos que antes teriam um significado divino, mas também alertou para os riscos de ir longe demais, aludindo à manipulação genética. Num tempo em que a doença é vista “como sinónimo de terrorismo, algo evitável e sempre a combater, a qualquer preço”, o Professor Catedrático de Epidemiologia e Medicina Preventiva e Diretor do Instituto de Higiene e Medicina Social da FMUC explicou não concordar com essa posição pois “a doença é também atributo da vida” . “Devemos lutar contra as doenças? Claro que sim. Devemos fazer todos os possíveis para a prevenir? Com certeza! Seremos capazes de as eliminar? Provavelmente, não. Quando tal acontecer, se é que isso irá algum dia acontecer, deixaremos de ser humanos e passaremos a ser transumanos ou qualquer coisa semelhante”. Sublinhou, a dado trecho da sua intervenção: “As novas técnicas, que são cada vez mais diversificadas, não deixam de levantar numerosos problemas éticos”. Desejando os maiores sucessos pessoais e profissionais, Salvador Massano Cardoso afirmou: “O vosso futuro vai ser muito atribulado face às novas conquistas tecnológicas e às exigências que a sociedade vai impor. Vão ser confrontados com inúmeras situações difíceis de resolver, porque há que ter em conta velhos princípios que são a essência da nossa profissão. Não podem em circunstância alguma abdicar dos vossos deveres, embora reconheça ser um fardo muito pesado o futuro dos médicos. Mesmo assim há algo de belo, de criativo e de realização na nossa profissão, ajudar os que sofrem e evitar que muitos possam sofrer.  Que ninguém duvide, a felicidade do próximo depende imenso da sabedoria, humanidade e empenho dos médicos. “

O Bastonário da Ordem dos Médicos lembrou ainda a árdua tarefa de quem exerce medicina nas zonas do interior do território continental. E deixou uma mensagem final sob o signo da esperança: “a esperança que vamos colocar em vós. Não são mais os médicos do futuro. Vocês são os médicos do presente e, a partir de agora, têm de ser os portadores da esperança que devem transmitir a quem está à volta de vós: as equipas de saúde mas também a quem perdeu a esperança, aos vossos doentes, valorizando a relação medico/doente”. Uma esperança que deverá englobar o sentido de pertença ao sistema de saúde e à Ordem dos Médicos, para os quais o dirigente espera poder ter o contributo para que consigamos ter uma melhor prestação na Saúde. E, a estes médicos do presente, exortou Carlos Cortes: “deem forma ao futuro e sejam felizes”

O ministro da Saúde, Manuel Pizarro, deixou também umas palavras de apreço para os progenitores que acompanharam o percurso exigente dos jovens ali presentes. “Ser médico é mesmo uma tarefa difícil”, lembrou. “Estudo e trabalho não são toda a nossa vida mas, numa profissão tão exigente como a nossa, serão sempre uma parte muito significativa da nossa vida”, nomeadamente porque exige-se um empenho total para manter a atualização em face do avanço da Medicina, mas, no entanto, recordou ainda, que os médicos podem fazer outras coisas levando a que possam ter “uma visão humanista que vá para além do aspeto tecnológico da Medicina”. “Os médicos são essenciais à Medicina  e à evolução do SNS”, acentuou o titular da pasta da Saúde, lembrando “as pressões que o SNS” sofre, à semelhança de outros serviços de saúde de países desenvolvidos.

E, voltando-se especificamente para os jovens médicos, citou William Osler: “Ver pacientes sem ler livros é como navegar sem cartas de marear; mas ler livros sem ver pacientes é a mesma coisa que não navegar de todo”, concluiu, desejando boa viagem aos colegas recém-chegados à profissão.

Nesta cerimónia estiveram presentes muitos dirigentes da Ordem dos Médicos e outras individualidades da sociedade civil, entre as quais, Mónica Fonseca, Vice-Presidente do Conselho Regional do Sul; João Pedro Silva, Presidente da Sub-Região da Guarda; Ana Rita Fradique, Conselho Nacional do Médico Interno; Mário Lino Barata Raposo, Reitor da UBI; Vítor Pereira, Presidente da Câmara Municipal da Covilhã; Comissário Rui Marques, Comandante da Divisão da PSP da Covilhã.

O juramento de Hipócrates, aqui

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