Intervenção do médico Dimas Simas Lopes. As palavras do autor do Monumento ao Médico de Família

Intervenção do médico Dimas Simas Lopes. As palavras do autor do Monumento ao Médico de Família

Eis as palavras, na íntegra, do autor da pela escultórica P´la Esperança, colocada na rotunda do Alto de S. João, em Coimbra:

 

"Em abril de 2010, ao receber uma chamada do meu colega de curso Doutor Hernâni Caniço, a propor que eu conceba uma peça de arte pública, para comemorar os 20 anos do Ensino de Medicina Geral e Familiar da Faculdade de Medicina de Coimbra, a erguer num espaço desta cidade, não demorei a dizer que sim. Um convite deste calibre, para assinalar o saber e o desempenho dos colegas, na cidade onde todos nos formamos e para quem intervém no âmbito da arte, é sempre um desafio acompanhado por um sentimento de consideração. Para o convidado significa que quem convida nele acredita.
Em 2007, ao assinalar-se os 30 anos do nosso curso médico de 1971-1977, foi com prazer que colaborei com o meu quinhão para a festa, com 6 figuras em aço, em redor de um centro, que se unem a dançar. São 6 dançarinos acrobatas a festejar os 6 anos de curso, peça que foi implantada na rotunda que se situa entre os Hospitais da Universidade de Coimbra e o Novo Hospital Pediátrico desta cidade. Ao receber o convite do colega Hernâni, achei que foi um sinal, que ele tinha achado graça à dança, e de imediato comecei a pensar a nova peça. E quando lhe enviei a memória descritiva e as imagens da maqueta, como um lavrador que se preza, dei um nome aos bois, batizei a escultura com o nome PELA ESPERANÇA.
Aceites a minha proposta e o orçamento de execução da empresa Serralharia do Convento, rebenta a crise no olho do furacão e o colega informa que não há condições dos patrocinadores de avançar com o projeto, havia que esperar por melhores dias.
Cerca de 5 anos depois, em vésperas do natal 2015, sou informado que passou a tempestade, o tempo amainou e que se pode dar fogo à peça!
Como sempre, mais vale tarde do que nunca, a escultura assinala agora os 25 anos do ensino de MGF na Faculdade de Medicina de Coimbra.
No título que emprestei à escultura, vem uma palavra que faz parte do vasto léxico dos médicos, a esperança, muitas vezes no acto médico, a primeira entre muitas, como prevenir e tratar e curar e aliviar e compaixão.
Nos extremos, há duas palavras que saem do âmbito da ciência, mas cabem na arte dos médicos, a esperança e a compaixão, que não precisam de ser ditas, bastam ser sentidas ao lado de quem sofre. Como uma alegoria, esta peça tem um prato circular que suporta um grande vaso, que se pode associar à antiga prática da alquimia e da farmácia, na esperança de descobrir o elixir da longa vida e da eterna juventude, à procura da panaceia, do remédio para todos os males, com um fundo metafísico, a eterna utopia da medicina.
O conjunto do prato e do vaso podem também sugerir a corola e o cálice de uma flor, símbolo da vida. E a balançar, como n pescoço dos médicos, a metamorfose de um estetoscópio, com o seu símbolo. Até à atual sofisticação da medicina, munida de uma tecnologia ao seu serviço, até há pouco indispensável, é bem longa a história da ciência médica, e é bom lembrar que não se pode compreender o presente sem conhecer o passado, quantas vezes desconhecido.
Na paisagem, a escultura vive do seu porte e do movimento de um componente e da luz de várias cores, que dela emanam durante a noite, altura em que despertam e se animam as relações químicas dentro do grande vaso.
Ao movimento e à luz, passei pela tentaçãoo transitória, de juntar o som do cachão e do borbulhar do interior do vaso, e arrefeci, na opinião do construtor, Miguel Feraraz, esse som seria diluído e abafado pelo volume de tráfego que circula à volta. E a fazer ouvir, como bem merece a música que celebra a esperança e a juventude da Sagração da Primavera de Stravinsky ou Daphins e Chloé de Ravel, era belo, se não distraísse os condutores!
Com esta peça ao contribuir para a merecida homenagem aos médicos de Medicina Geral e Familiar, que são a frente e fundamento e alicerce do nosso Serviço Nacional de Saúde, o mais generoso projeto deste país, desde 25 de abril, com a visão e impulso fundamental do Dr. António Arnaut desta cidade, também desejo me associar ao belo gesto da Câmara Municipal de Coimbra, ao dar o nome do grande democrata e médico, Dr. Fernando Vale, à estrada que desemboca no rotunda onde a peça está implantada.
E no fim, que esta escultura seja como mais uma árvore, que se planta numa rotunda da bela e fraterna Coimbra.".

Dimas Simas Lopes, 19 de maio de 2016

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