Juramento de Hipócrates: Compromisso de uma nobre profissão

Juramento de Hipócrates: Compromisso de uma nobre profissão

Compromisso renovado e a recordação de um momento com muita alegria! Realizou-se no sábado dia 7 o Juramento de Hipócrates na cidade de Coimbra, última cerimónia de acolhimento aos novos médicos deste ano.

Carolina Cabaços, vocalista da banda Sexta Feira Santa e médica psiquiatra, explicou a MD Centro a honra de renovar o seu juramento juntando a sua voz às dos colegas mais novos que participaram nesta cerimónia simbólica. “É muito importante que os mais novos interiorizem estas palavras quando fazem o juramento de Hipócrates. Agora, julgo eu ainda não conseguem alcançar toda a importância deste compromisso. Tenho a certeza que estão muito emocionados, mas só daqui por uns anos é que irão repensar o verdadeiro sentido deste texto”. 

Assume ainda que cada vez que escuta estas palavras, “a cada ano que passa e com mais experiência clínica e já com o internato feito, é que começo a perceber o que é não causar dano aos nossos doentes, de cuidar deles independentemente de tudo”. Carolina Cabaços destaca ainda a importância do novo Juramento de Hipócrates que foi lido coletivamente, pela primeira vez, em Coimbra, a 19 de novembro de 2017. “É muito importante este novo texto, isto é, também a necessidade do autocuidado, o cuidado que os médicos têm de ter com a sua própria saúde, fundamental para podermos cuidar dos outros”. 

Assumindo uma alegria desmesurada, com lágrimas pelo rosto, estava Maria Emília Matos Seabra, do Luso, uma mãe com orgulho infinito na sua filha: “Foi um longo caminho, mas é a concretização de um sonho”. A filha Mariana Seabra Ferreira é uma das 115 jovens que assumiram o seu Juramento de Hipócrates. “Este choro é um misto de emoções”, justifica, não deixando de mostrar o orgulho de uma luta dos últimos seis anos “que valeu muito a pena”.

E é neste contexto de conquistas, dificuldades, desafios, que agora apresentamos as intervenções nesta sessão solene que decorreu no Auditório dos Hospitais da Universidade de Coimbra e cuja atuação do Coro da Ordem dos Médicos marcou o início da sessão solene que marcou o juramento de 115 jovens médicos.

Manuel Teixeira Veríssimo abordou alguns desafios: “Vivemos num tempo de mudanças extraordinárias. Este século trouxe-nos avanços científicos e tecnológicos inimagináveis, como a inteligência artificial, a genómica, a robótica e a medicina de precisão que transformaram a forma como diagnosticamos, tratamos e prevenimos as doenças. Estas ferramentas poderosas têm o potencial de salvar vidas e aliviar o sofrimento humano como nunca, contudo, deveremos estar cientes que trazem também grandes desafios éticos, sociais e profissionais”. 

Para o Presidente da SRCOM, nesta nova Era na Medicina, repleta de desafios e oportunidades sem precedentes”, a tecnologia “por mais avançada que seja, será sempre uma aliada, mas nunca deverá ser o centro” da atuação dos médicos. E aludiu, aliás, a múltiplas questões complexas: “Como equilibrar a automação com a humanização dos cuidados médicos? Como respeitar a privacidade dos dados num mundo de digitalização crescente? Como assegurar que a inovação beneficia todos, independentemente da sua condição social, económica ou geográfica? Entre outras.”.  A resposta “embora difícil”, acrescenta, “terá de ter o vosso contributo, mas nunca deveremos esquecer que no coração da medicina, permanece o que nos diferencia: a empatia, o respeito pela dignidade humana e o compromisso com o bem-estar do outro. Por mais que a tecnologia evolua, nunca substituirá o toque humano, o olhar compreensivo, ou a escuta atenta que transformam a consulta médica e a relação médico-doente num verdadeiro património da humanidade”. E acentuou: “Hoje, assumem um compromisso com a humanidade. Guardem esta responsabilidade com honra, com humildade e com uma determinação inabalável de fazer o bem. Este é o vosso tempo, e a medicina precisa de cada um de vós como médicos preparados, éticos e humanistas. Incentivando os mais novos a serem “a mudança”, afirmou ainda: “Este juramento que hoje assumem não é um fim, mas sim o começo de uma vida desafiante, embora também gratificante, edificada num caminho onde a excelência é medida não apenas pelos resultados, mas também pela empatia, pelo cuidado compassivo e pelo respeito pela sacralidade da vida humana. Hoje, assumem um compromisso com a humanidade. Guardem esta responsabilidade com honra, com humildade e com uma determinação inabalável de fazer o bem. Este é o vosso tempo, e a medicina precisa de cada um de vós como médicos preparados, éticos e humanistas”.

Ora coube a Luiz Miguel Santiago proferir a Lição de Sapiência. Doutorado em Medicina pela Universidade de Coimbra e membro da Academia Europeia de Professores em Medicina Geral e Familiar, Luiz Miguel Santiago colocou também o acento tónico no futuro, nas questões que ele nos convoca e nas circunstâncias a que deveremos estar atentos. Perguntas, desde logo sobre liderança: “Qual a liderança que pode e deve o Médico ter e como a exercereis, como Médicos? E com os outros com quem trabalhareis, como exercereis a vossa influência?”. Como farão a partilha do conhecimento e que relação com quem estarão a atender? Questiona: “Como sereis solidários para evitar o mal-estar, a ansiedade, o burnout na Vossa equipa? Sempre se disse que na Academia de Coimbra estes valores de altruísmo, camaradagem,

solidariedade e fraternidade eram mote e prática… espero que o não esqueçam na Vossa vida futura!” 

E, na senda das perguntas, Luiz Miguel Santiago interrogou ainda: “Sendo eu sistémico o Modelo da Medicina Centrada na Pessoa, com empatia é-me importante. Todos direis que são empáticos, mas… sê-lo-eis na prática? Aquele tripé da empatia ainda está presente?” E perante os avanços tecnológicos, questionou também: “Quando alguém consultar um médico ou a sua equipa com o seu caso já estudado na internet ou futuramente na “inteligência artificial” referindo ter esta ou estas doenças e que quer estes exames e aqueles tratamentos, que Vos acontecerá? Que papel passareis a ter como médicos? Que exigências comunicacionais e outras passareis a ter de desempenhar?”. Para quem está em constante ligação com os discentes – teve e tem a seu cargo orientação de Trabalhos Finais de Mestrado Integrado em Medicina, Teses de Mestrado pré-Bolonha na Universidade de Coimbra e Dissertações de Doutoramento na área da Medicina Geral e Familiar, tendo sido arguente e membro de Júris em Mestrado pré e pós Bolonha e em Doutoramento – Luiz Miguel Santiago assegurou: “A futura Medicina, terá por certo em Vós excelentes e adaptados profissionais. Seja qual for a Especialidade e seja onde seja que a exerçam, o fito que seja o de ser ‘o Bom Médico’: o balanço do saber com o fazer para o próximo”, desejando a todos “o melhor futuro”. 

Desafios foram também o fio condutor do discurso do bastonário da Ordem dos Médicos. E logo no momento em que cumprimentou o presidente da ULS Coimbra, Professor Doutor Alexandre Lourenço, e em representação da direção clínica, Catarina Geraldes, o Bastonário da Ordem dos Médicos lembrou logo a complexidade desta estrutura que é uma das maiores do país. 

Carlos Cortes agradeceu a “magnífica palestra” do Professor Luiz Santiago, cujos valores que transmitiu “são os princípios que nós médicos defendemos ao longo dos milénios, da história da Humanidade”. Olhando para a plateia e recordando o respeito pelos mestres, o Bastonário da Ordem dos Médicos enalteceu o apreço de quem, do ponto de vista científico e da intervenção académica, muito fez pelos médicos e pela Medicina: um imenso agradecimento público ao Professor Diniz de Freitas. As palmas irromperam pela sala e o bastonário pediu também idêntico gesto de aplauso ao agradecer “aos pais, às mães, à família” pelo trajeto conjunto até “esta entrada na profissão médica”. Reportando a esta cerimónia, que classificou de “momento único de uma longa tradição, desde há milénios”, Carlos Cortes lembrou: “em vós, nos vossos ombros, estará depositada uma responsabilidade, dos atos que irão junto dos vossos doentes. As palavras que irão pronunciar neste juramento terão um profundo significado para vós, mas estou convencido que tal como aconteceu a mim, estas palavras irão ter um significado muito mais profundo ao longo dos próximos anos. Estou certo que, em muito momentos da vossa vida, de dificuldade e de desespero, irão procurar estas soluções naquilo que ouviram hoje. Está tudo escrito no Juramento de Hipócrates: é um texto curto, mas com profundo significado”. 

Carlos Cortes lembrou o Relatório das Carreiras Médicas, a criação do SNS, o Serviço Médico à Periferia como conquistas protagonizadas por médicos. “Não há saúde sem liberdade e liberdade sem saúde”, enfatizou. E, mais recentemente, lembrou a resposta pronta e abnegada dos médicos face à pandemia COVID-19. “A página da pandemia foi virada graças à força, à luta e a coragem, entrega dos médicos deste país”. E irromperam de novo as palmas. Mas, neste contexto, há um lamento e um alerta a ter em conta: “Temos hoje, um SNS a desmoronar-se, a perder a sua identidade e a perder os princípios básicos defendidos por António Arnaut”. O Bastonário definiu, aliás, o SNS como “uma crónica de um desastre anunciado”. Carlos Cortes garantiu que, sob a sua liderança, a Ordem não irá desistir de dar o seu contributo, exemplificando com o trabalho que está a desenvolver, nomeadamente o documento já entregue à tutela para melhorar a atratividade do SNS, mas que ficou na gaveta e, mais recentemente, a preocupação com um concurso em que muitas vagas ficaram por preencher, com prejuízo potencial para a formação dos colegas e para o futuro e sustentabilidade do SNS, isto, precisamente, na semana em que se soube que 600 candidatos não escolheram qualquer especialidade, sobrando 300 vagas (eram mais vagas do que candidatos), sendo a Medicina Geral e Familiar, a Medicina Interna ou a Saúde Pública das especialidades com menos procura. Para o dirigente da OM, “isto pode ter um impacto desastroso sobre a sustentabilidade e a capacidade de resposta do SNS nos próximos anos”. 

Calos Cortes lembrou, porém, que a medicina moderna enfrentou muitas dificuldades, mas os médicos souberam ultrapassar todos os obstáculos. O desafio da humanização, o desafio do inconformismo e o desafio da esperança foram o remate da sua intervenção. 

E foi com o som da banda Sexta Feira Santa que se antecedeu o momento final com a tão almejada fotografia de grupo. Parabéns a todos!

A cerimónia foi apresentada pelas médicas de família Liliana Constantino e Teresa Pascoal.

Partilhe nas redes:

Ordem dos Médicos