SNS em debate na Ordem dos Médicos

SNS em debate na Ordem dos Médicos

A Secção Regional do Centro da Ordem dos Médicos (SRCOM) acolheu a 16 de abril, o debate "SNS: Valor financeiro ou valor humano?". A sessão resultou de uma organização conjunta da Secção Regional do Centro da Ordem dos Médicos com a Fundação Assistência, Desenvolvimento e Formação Profissional (ADFP) com o objetivo de debater questões fulcrais sobre o Serviço Nacional de Saúde (SNS), enquadrando-se esta iniciativa no debate e discussão na Assembleia da República sobre a futura Lei de Bases da Saúde. O tema continua a suscitar polémica e preocupações, designadamente nas relações entre o setor público com o privado, com o setor social e com o da economia solidária.

Moderado pela vice-presidente da Secção Regional do Centro da Ordem dos Médicos, Inês Rosendo, o debate contou com as intervenções de Adalberto Campos Fernandes (PS), ex-ministro da Saúde; Ricardo Baptista Leite (PSD), deputado na Assembleia da República e porta voz para a Saúde; e Jaime Ramos, presidente da Fundação ADFP e ex-presidente da Administração Regional de Saúde do Centro. De referir que a ADFP, uma Instituição Particular de Solidariedade Social (IPSS), construiu um hospital em Miranda do Corvo que ainda não estava em funcionamento à data deste debate.
Jaime Ramos na sua intervenção inicial, destacou, desde logo, a imensa diversidade de serviços existentes o nosso país, a cargo das IPSS como modelos alternativos, tal como já acontece nos centros de dia, nos programas de atividades de tempos livres, nas creches, etc. "Na sua genética, as IPSS nasceram para combater e prevenir o sofrimento e têm de defender o interesse público, pelo que a relação com o Estado deve ser de cooperação e de parceria justa e equilibrada", assinalou o médico que preconizou pois a existência de modelos diferentes de cuidados de saúde, para além do privado e do setor público, que passem pelas instituições de solidariedade social em cooperação com o Estado. Jaime Ramos fez aliás uma resenha histórica sobre o movimento cooperativo, lembrando os fundadores da I República e citando o ideário social-democrata.

"Nós não temos muitas diferenças de interpretação em relação à social-democracia", disse desde logo o antigo governante socialista, para quem o âmago do Serviço Nacional de Saúde são as pessoas, acautelada a conciliação entre o valor técnico e o valor humano. "O Estado existe para fazer atenuar as diferenças entre quem tem muito e quem tem pouco. Hoje, tal como ontem e tal como o futuro, países com a dimensão do nosso, necessitam da cooperação em detrimento da confrontação", sublinhou Adalberto Campos Fernandes. O antigo ministro deu conta do esforço de modernização do SNS, quer em unidades de saúde quer em equipamentos.

 

Para o deputado social-democrata Ricardo Baptista Leite, médico e coordenador científico de Saúde Pública, o mais recente resgate financeiro protagonizado pelo nosso País "serviu para o resgate da nossa autonomia" uma vez que, sublinhou, "a economia serve para gerar riqueza de modo a que o Estado possa cumprir o seu papel". Foi este o enquadramento basilar da sua intervenção no âmbito da justiça social. "O que verificamos, hoje, é que há um crescimento económico a partir dos nossos impostos, o que acaba por ser uma situação de enorme fragilidade em riscos futuros", sublinhou, assumindo que o ministro da Saúde naquele período de crise financeira deveria ter sido um ministro de Estado. "Infelizmente não aconteceu, não assumimos que a Saúde é um sector gerador de riqueza, o que limita a nossa ação" lembrando que, ao contrário do que muitas vezes se diz, "a Saúde não é a área em que se consome mais dinheiro". Deixou uma reflexão sobre o pagamento da dívida e que futuro queremos construir. Em seu entender, o papel da Saúde Pública é crucial para os modelos de gestão e de governança, a fim de diminuir a carga da doença no sistema. "Nós para conseguirmos responder à pergunta [que dá o mote para este debate], a humanização é o caminho incontornável para garantirmos melhor qualidade de vida e maior justiça social e acredito que será possível com as reformas necessárias, encontrando consensos, manter a visão do serviço de saúde universal".

Ainda antes do período de debate, o Professor Adalberto Campos Fernandes, lembrando que teve a responsabilidade nos últimos quatro Orçamentos do estado na área da Saúde, deixou a nota de que deixou "a dívida a fornecedores atingiu o nível mais baixo da legislatura" mas recordou que a dívida autoalimenta-se. Por outro lado, deu conta que "o SNS tem resiliência e automatismos: nós hoje temos 94 por cento da população com médico de família, não há muitos países da Europa que tenham esta taxa de cobertura. […] O Dr. Baptista Leite sabe que somos apresentados, lá fora, como um exemplo em muitas áreas. Finalmente, que diferença faria se nós, em torno de um desígnio nacional, nos entendêssemos no parlamento num espectro muito amplo e muito largo, não sobre matérias de organização dos serviços, mas sobre resultados? Estamos a fazer a discussão toda à volta dos processos e estamos a ignorar os resultados. A título de exemplo, todos os partidos deveriam ter como objetivo reduzir a diabetes em Portugal; devíamos pegar nos grandes objetivos nacionais, que derivam da OMS — tuberculose, hepatite C, VIH/Sida, Saúde Mental, Diabetes — e devíamos ter a ambição de construir uma sociedade mais saudável sempre numa lógica de construção de uma sociedade mais saudável que está prestes a enfrentar um saldo vital devastador, pois não vamos ter população ativa para proteger os mais velhos".
Após as intervenções teve lugar um período de debate, aberto a todos os médicos bem como a outros profissionais do SNS e todos aqueles de outras áreas do Saber que ambicionam uma visão plural e com princípios éticos, com alternativas e sem dogmas.

O debate teve lugar pelas 18h00, na Sala Miguel Torga, na sede da SRCOM (Avenida Afonso Henriques, Nº 39), em Coimbra.

 

 

 

© Fotos/SRCOM – Paula Carmo  

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